
A pequena cidade de João Dias, no interior do Rio Grande do Norte, com pouco mais de dois mil habitantes, foi palco de um dos episódios mais graves de interferência de facções criminosas na política brasileira. O prefeito Francisco Damião de Oliveira, conhecido como Marcelo, foi executado ao lado do pai durante a campanha para sua reeleição em 2023. A morte foi o desfecho trágico de um esquema que envolvia o Primeiro Comando da Capital (PCC) e um acordo político firmado ainda na eleição de 2020, quando Marcelo venceu com Damária Jácome, irmã de traficantes ligados à facção, como sua vice.
Investigações apontam que Marcelo havia recebido dinheiro de Deusamor Jácome, traficante internacional procurado pela Interpol, para aceitar a aliança política. Contudo, ao assumir o cargo, ele teria resistido às ordens da facção e acabou renunciando em 2021 sob pressão, dando lugar a Damária. Segundo a Polícia Civil, mesmo antes da renúncia oficial, os irmãos Jácome já controlavam de fato a gestão municipal, administrando recursos federais que somaram R$ 23 milhões em 2023, evidenciando o interesse financeiro das facções no domínio político local.
O caso de João Dias não é isolado. Relatório sigiloso da Polícia Federal e do Ministério Público revelou tentativas de interferência de facções em ao menos 42 cidades brasileiras durante as últimas eleições municipais. O PCC, por exemplo, teria investido cerca de R$ 8 bilhões no apoio a candidaturas. Em João Dias, o conflito pelo controle da prefeitura se agravou após Marcelo retomar o cargo por decisão judicial em 2022. Durante a nova campanha eleitoral, a tensão aumentou e ele passou a colaborar com as autoridades, o que teria sido determinante para o atentado que resultou em sua morte e na do pai, em uma barbearia.
A polícia aponta que Damária e sua irmã, Leidiane, vereadora da cidade, foram as mandantes do assassinato. Elas teriam contratado criminosos que ficaram escondidos em um sítio da família antes do crime. Até o momento, nove pessoas foram presas e quatro estão foragidas, incluindo Damária. Enquanto isso, a viúva de Marcelo, Maria de Fátima Mesquita, assumiu a prefeitura. Em nota, a atual gestão afirma que o município vive um momento de profunda instabilidade, mas tenta restabelecer a ordem. O caso expõe a gravidade da infiltração do crime organizado no poder público e a necessidade urgente de medidas para proteger a democracia nas pequenas cidades do interior do Brasil.
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